Morbidez, de acordo com o dicionário, é qualidade do que é enfermo, doente. Não sei se minha nova idade tem algo a ver com isso, mas de uns tempos pra cá tenho pensado muito na morte.
Calma. Antes que pensem que vieram a mim impulsos suicidas inconvenientes - vamos direto ao ponto: suicídio é burrice. Por que adiantar algo que inevitavelmente vai nos acontecer, quer nós queiramos ou não? - , apenas estou me dando conta dessa loucura efêmera e viciante que é a vida. E me dou conta disso vendo a morte de perto.
Primeiro, a morte da inocência. O mundo era vívido, cheio de bonecos em sépia, culpa da televisão preto-e-branco e desejos pueris por um amigo imaginário, uma goma de mascar de hortelã e tampas de lata de cera usadas como "discos voadores" (nem sabia que o neologismo frisbee existia). Eis que um dia descobre-se a vida com seus desejos sexuais, sonhos de consumo mais complexos e frasese com duplo sentido insuspeitos. Jogamos o punhado de terra na vala e vemos o esquife descer, chamando isso de maturidade.
Aí os projetos e ilusões morrem a cada currículo não lido, a cada nota ruim na escola, a cada frase preconceituosa. Mais um esquife, e o que resta, além do caule de uma gérbera, é um cadinho de sentimentos que pode se tornar cinismo, revolta, permissividade, passividade...
Para quem ainda consegue sobreviver e ser uma pessoa dita "normal", com lembranças e algumas ambições, vê a Morte, aquela com M maiúsculo (desde que vi a criação de Neil Gaiman, ela agora é para mim a garota gótica com o Ankh pendurado). Eu vejo a Morte quando alguma figura pública deixa o plano físico e se torna imagens de arquivo.
Dia desses, estava conversando com minha irmã e disse "o dia que eu ouvir que o Cid Moreira morrer ,algo em mim vai morrer até que meu dia chegue". Elegi o apresentador e locutor por associação de ideias (estávamos assistindo ao Jornal Nacional), mas ela me falava do estranhamento em falar do Michael Jackson como mais uma personalidade morta.
Não digo que a morte dele não tenha me causado espécie; o que diluiu o impacto dela foi o circo de horrores midiático que a elegia e o posterior funeral se transformaram. Porém me lembrei de mortes que me fizeram sentir mais perto daquela angústia inexplicável. Como a morte do Peter Ustinov. Do Peter Sellers. Do Ulysses Guimarães. Da Lillian Lemmertz. Da Dina Sfat. Aquele tipo de personalidade que aparentemente não te causa nenhum frisson quando está lá, cantando, atuando, pedindo votos ou o que quer que seja, mas quando se vai, solta-se um "nossa, fulano morreu", como se eles fossem, por intervenção de suas exposições quase onipresentes, destnados à imortalidade.
No dia 15 de setembro, mais um desses personagens "onipresentes" morreu. Talvez a culpa dessa presença fossem as reprises quase mensais de Ghost. Ou a adoração de minha irmã pelo filme Dirty Dancing - ela sempre se arrepia ao ver o número de dança final com Jennifer Grey.Ou minha implicância com a overdose de canstrice de Caçadores de Emoção (fala sério, Keanu Reeves, agente do FBI surfista? Gary Busey?). O fato é que Patrick Swayze era um porto seguro. Alguém que sempre estaria lá para que eu pudesse destilar meu cinismo ou fazer um comentário nada abalizado sobre qualquer coisa.
Não sei o que me deu. Ao me deitar naquela noite, até Hercule Poirot, ficção pura, visitou meus pensamentos. E Agatha Christie. David Niven. Renato Russo. Rubem Braga. Vi aquela representação do Gaiman. E dormi um sono pesado, sem sonhos depois do meu peito ser apertado por um calhamaço de inúteis angústias.
O engraçado é que a vida continuou no dia seguinte.
Calma. Antes que pensem que vieram a mim impulsos suicidas inconvenientes - vamos direto ao ponto: suicídio é burrice. Por que adiantar algo que inevitavelmente vai nos acontecer, quer nós queiramos ou não? - , apenas estou me dando conta dessa loucura efêmera e viciante que é a vida. E me dou conta disso vendo a morte de perto.
Primeiro, a morte da inocência. O mundo era vívido, cheio de bonecos em sépia, culpa da televisão preto-e-branco e desejos pueris por um amigo imaginário, uma goma de mascar de hortelã e tampas de lata de cera usadas como "discos voadores" (nem sabia que o neologismo frisbee existia). Eis que um dia descobre-se a vida com seus desejos sexuais, sonhos de consumo mais complexos e frasese com duplo sentido insuspeitos. Jogamos o punhado de terra na vala e vemos o esquife descer, chamando isso de maturidade.
Aí os projetos e ilusões morrem a cada currículo não lido, a cada nota ruim na escola, a cada frase preconceituosa. Mais um esquife, e o que resta, além do caule de uma gérbera, é um cadinho de sentimentos que pode se tornar cinismo, revolta, permissividade, passividade...
Para quem ainda consegue sobreviver e ser uma pessoa dita "normal", com lembranças e algumas ambições, vê a Morte, aquela com M maiúsculo (desde que vi a criação de Neil Gaiman, ela agora é para mim a garota gótica com o Ankh pendurado). Eu vejo a Morte quando alguma figura pública deixa o plano físico e se torna imagens de arquivo.
Dia desses, estava conversando com minha irmã e disse "o dia que eu ouvir que o Cid Moreira morrer ,algo em mim vai morrer até que meu dia chegue". Elegi o apresentador e locutor por associação de ideias (estávamos assistindo ao Jornal Nacional), mas ela me falava do estranhamento em falar do Michael Jackson como mais uma personalidade morta.
Não digo que a morte dele não tenha me causado espécie; o que diluiu o impacto dela foi o circo de horrores midiático que a elegia e o posterior funeral se transformaram. Porém me lembrei de mortes que me fizeram sentir mais perto daquela angústia inexplicável. Como a morte do Peter Ustinov. Do Peter Sellers. Do Ulysses Guimarães. Da Lillian Lemmertz. Da Dina Sfat. Aquele tipo de personalidade que aparentemente não te causa nenhum frisson quando está lá, cantando, atuando, pedindo votos ou o que quer que seja, mas quando se vai, solta-se um "nossa, fulano morreu", como se eles fossem, por intervenção de suas exposições quase onipresentes, destnados à imortalidade.
No dia 15 de setembro, mais um desses personagens "onipresentes" morreu. Talvez a culpa dessa presença fossem as reprises quase mensais de Ghost. Ou a adoração de minha irmã pelo filme Dirty Dancing - ela sempre se arrepia ao ver o número de dança final com Jennifer Grey.Ou minha implicância com a overdose de canstrice de Caçadores de Emoção (fala sério, Keanu Reeves, agente do FBI surfista? Gary Busey?). O fato é que Patrick Swayze era um porto seguro. Alguém que sempre estaria lá para que eu pudesse destilar meu cinismo ou fazer um comentário nada abalizado sobre qualquer coisa.
Não sei o que me deu. Ao me deitar naquela noite, até Hercule Poirot, ficção pura, visitou meus pensamentos. E Agatha Christie. David Niven. Renato Russo. Rubem Braga. Vi aquela representação do Gaiman. E dormi um sono pesado, sem sonhos depois do meu peito ser apertado por um calhamaço de inúteis angústias.
O engraçado é que a vida continuou no dia seguinte.
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