Amor. Não é algo que eu conheça tão bem. O amor não é como um vizinho onde nos refugiamos quando precisamos fofocar ou pedir uma chave de fenda emprestada. O amor não é como a fome, que se contenta com qualquer prato de salada de alface ou um fumegante frango ao molho pardo. Ele pode estar ao seu lado, dando colo e carinho; pode saciar e aquecer enquanto pula sob a pele.
O amor é um estranho sem nome. Não é o pai que nos confecciona um carrinho de rolimã, a mãe que nos aguarda pacientemente no portão da escola ou o irmão com quem dividimos tapas e o saquinho de pipoca. O amor apenas faz o coração bater em descompasso, emocionado e com medo; nos afaga no umbral da porta qual vento marinho e quase nos faz maldizer a dor que a ausência de cinco minutos e uma palavra obscura causam.
Muitos dizem que preciso encontrar e conhecer o amor. Como? Ele não é uma taça de absinto até a borda, verde e altamente inebriante. Tampouco é o ar, invisível porém facilmente notado ao dilatarmos as narinas buscando tanto ar quanto aromas. Ele não é uma caneta esferográfica nem um caderno. Não se presta a ser ouvido como as sete notas musicais. O amor nos deixa atordoados, com passos inseguros e com uma ressaca só curada com mais uma overdose. Ilude a todos fingindo ser vital e, tão bem fundamentados são seus argumentos mudos, torna-se parte da circulação e das terminações nervosas. Passa para a eternidade gravada na batida frase “eu te amo” dita n vezes.
Se o amor fosse sólido como um aperto de mão, líquido como o banho revigorante, rápido como o carro de competição, seria possível ter um conhecimento, ainda que pífio, da estrutura – forma, cor, cheiro, sensação. Se pudesse conversar com o amor, sentados frente a frente, eu e ele, talvez ele se explicasse e eu pudesse me fazer entender. O grande problema é o imponderável. O amor não aperta a mão, e sim o peito; não banha, afoga; não conversa, nos insere num monólogo. Como podemos criar um campo hospitaleiro diante dessa muralha?
O amor dá medo. Ele pula em cima dos incautos sem cerimônia. Você está descendo do ônibus e no final do degrau, pam! A criatura mais linda do mundo. Você está nervoso, cuspindo cigarros e orações pagãs e pam! O bebê mais lindo do universo, seu filho ou filha. Você está num sofá, vigiando o ponteiro dos segundos, mastim impaciente e pam! A campainha ou o barulho do trinco, prenúncio do abraço. O avião ou o ônibus afasta duas pessoas e pam! Grossas gotas salgadas minam dos olhos.
Há quem desdenhe o amor, não por conhecê-lo, mas por não poder mantê-lo sob rédeas submissas. O amor não é um cãozinho adestrado, um peixinho dourado acomodado, um gato castrado. O amor não é animal, vegetal ou mineral. Ele é o orgulhoso detentor de um feudo na malha do tempo e da eternidade. O eventual desdém é simplesmente a maior prova de ignorância, no sentido puro da palavra, do que seja o amor.
Não sei o que é e nunca o conhecerei. Mas se ele não se incomodar, não farei o mínimo esforço para entender. Não criarei canções, não pintarei quadros expressionistas, não me derreterei em versos decassílabos, não dissecarei teorias, teoremas, monografias, roteiros e hipóteses. Apenas beijarei a boca de quem amo.
7 comentários:
Vc se diz meio, meia duzia nao sei bem do que...mas escreve por inteiro,Homem !
Sou eu quem te agradece, especialmente
pelo beleza de "Un attimo senza fine".
Viajei no tempo, de lá pra cá...
Senza ieri, senza domani...
Grazie, fratello.
Depois de algum tempo existindo neste mundinho, cada vez mais me pego pensando se esse raio de amor realmente existe ou é só uma ilusão procuro sem chance de achar... ai ai
Será que o problema sou eu?
Hy
Nossa, sei que vai parecer um comentário vazio, mas...
UAU!....
O sentimento em suas palavras é quase palpável...
olá Sidney!
Vi que você mora em Indaiatuba!
Eu sou daqui tb!
Fiquei surpreso, pois vim parar aqui através do blog do Inagaki, por acaso mesmo!
É que falou de algumas pessoas que conheço..rs
Fiquei impressionado com o seu tato com as palavras!
Amor é fácilmente percebido, mas dificilmente compreendido.
Eu quero amar alguém que me faça bem... Só isso :P
Apenas mais um, entre tantos! te parabenizando! ;)
"O amor é de cada um e cada um sente do seu jeito.e alguém tentar explicar, não poderá fazê-lo direito, porque quando o amor acontece, ninguém o tem...Ele é que tem o sujeito"
(Leila Dohoczki)
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