7.9.07

Se quer saber como estou...

Um relacionamento fora do seio familiar é uma das mais, senão a mais, importante decisão que tomamos. Não nascemos do ventre de quem escolhemos, não somos "obrigados" a conhecer os defeitos, manias e cacoetes graças à convivência diária. Há a atração física - sejamos práticos, o primeiro sentido que usamos para reconhecer quem nos agrada é a visão; o resto é poesia e roteiro de Nora Ephron - e a primeira patética tentaiva de contato verbal, que vão desde uma piadinha supostamente bem sacada ao "será que vai chover" à guisa de papo. Há a reciprocidade, pois me refiro a relacionamentos que se iniciam; as primeiras conversas mais sérias e os silêncios. O beijo, o primeiro relacionamento sexual e a agradável rotina da descoberta de um mundo novo. Todos que amaram outra pessoa são Américo Vespúcio.

Se há maturidade, descobre-se que a outra pessoa é realmente outra pessoa, com suas idiossincrasias, roncos e tensões pré-menstruais, palitos de dente e cabelos longos no ralo, beijos na nuca e mãos na bunda. Os bem resolvidos mudam o que podem, aceitam o que dá e teorizam as diferenças ora num papo entre dentadas em uma pizza, ora numa briga entre cacos de um copo de requeijão. E vivem uma vida que escolheram ao lado de quem escolheram, com pressões acupunturais de felicidade entre contas e novas obrigações.

O fim desse realcionamento não chega a ser cogitado a sério graças a essas agulhas de sorrisos. Por isso dói tanto quando o fim chega. Os cacos aumentam de quantidade, o sexo só tem sabor se proibido, questões formuladas na época do "benzinho, mozinho" e respondidas com o gugudadá típico tornam-se adultas com a velocidade de vida de uma mosca drosófila. A pressão dessa vida atinge níveis insuportáveis e as agulhas de acupuntura não surtem mais efeito. É preciso uma intervenção cirúrgica e ela se assemelha à da piada: a operação foi um sucesso mas o paciente morreu.

A tristeza e a letargia do "pós- operatório" são conseqüências de uma derrota que demoramos a absorver, pois nos negamos a reconhecê-la. Tudo estava lá: as causas, os efeitos, a profilaxia. Por que optamos pela "simples" separação e seus devastadores efeitos colaterais? Agora aí está você, mergulhado por livre e espontânea vontade no poço da solidão, querendo manter um nível elevado de elegância.

Hoje, graças à banalização do que é brega, aliado ao mal uso dessa verdadeira instituição nacional - se os arautos do "british and american cool" não tivessem vilipendiado o requintado gosto popular da década de 1970, teríamos nossos próprios rhythm and blues e soul music - , temos que nos contentar em ser tristes ouvindo uma bela melodia em uma língua estrangeira ou um grupinho de adolescentes que fazem barulho em cima de uam letra emo. Serve, é claro, mas precisamos ir ao fundo do poço para que possamos reforçar os músculos na volta que sempre damos.

O último romântico, em uma de suas sempre bem feitas letras, vaticinou: as canções mais tolas, tendo seus defeitos, sabem diagnosticar o que dói no peito. Após uma faca tão amolada como a separação, você precisa é cauterizar a ferida com algo nada benevolente. A dor dessa cauterização pode matar alguns neurônios, mas só aqueles que você não vai mais usar. Inclusive os que fizeram você ouvir e quase gostar da tal música.

Tenho algumas sugestões. E não se preocupe. Se o fim é um dos supremos clichês, a volta por cima e o novo dia após o ontem é O supremo clichê.

Quando você se apaixonar de novo, queira sempre se apaixonar de novo.