7.9.06

A confraria das popozudas

Mariah Carey foi um fenômeno. Dona de uma voz que servia como arauto da década de 1990, ela colecionou sucesso atrás de sucesso com canções, como direi... melosas, como “Vision of love”. Ah, ser casada com Tommy Mottola ajudou um bocado. Seus recordes de vendas e permanência na parada Billboard pareciam eternos. Só esqueceram de avisar a eternidade.

Fenômenos têm vida curta, como miss Carey descobriu. Quando as benesses do sucesso estavam minguando ela resolveu se voltar ao espelho e ver que era bonita. Mais do que isso: gostosa. Ela uniu tudo isso a produtores de R&B e hip-hop (conhecidos por serem sexistas), calças corsário, micro-saias e coreografias que valorizavam os seios e glúteos. Hoje ela é um sucesso de novo, graças principalmente ao rebolado e aos clipes sugestivos.



Mary J. Blige se consolidou como uma cantora de personalidade forte, que soltava a voz em canções pop com lastro no jazz e R&B. Nunca a ouvi muito nas rádios daqui mas as críticas de seus discos sempre enfatizavam a seriedade e o repertório. Pena que não pude ver muito disso.

Dia desses, zapeando entre os milhares de canais abertos que nós temos (ok, a ironia não foi muito bacana...), ouvi uma música que simplesmente usava o arranjo de “Hey-yo” do dueto francês Tragedie, num clipe repleto de moças com trajes muito sugestivos. No meio delas, cantando afinada e sensualmente (e que batom é aquele?)... Mary J. Blige! Trajando o uniforme-gostosa-básico e remexendo seu corpo como se não houvesse amanhã.



Revi Nelly Furtado depois de alguns anos. Em meu chip de memória estava uma cantora neo-hippie com ar folk-rocker (putz, que horror essa catalogação!) por causa das músicas “I’m like a bird” e “Turn off the light”. Era suave, sutil até. Era.

Ao revê-la num videoclipe, ela estava acompanhada do rapper da hora (nem guardei o nome dele), sacudindo as cadeiras e vestindo o combo calça de cós baixo-top que mostra o umbigo. Pensei estar vendo uma Fergie menos calipígia ou mais uma neo-gostosa mostrando seu talento. Minha surpresa foi tão avassaladora quanto a mudança dela.



Esses exemplos pop do mundo paternalista e sexista em que vivemos me fizeram um questionamento: o que aconteceu com as conquistas femininas do século XX? Antes um ser que não tinha direitos básicos, voz ativa e que era apenas a perpetuadora da espécie humana. Humilhadas, menosprezadas e desvalorizadas, as mulheres deram a vida, literalmente, para a mudança de um status quo preconceituoso.

Por séculos elas foram “culpadas” pelo desejo que os homens sentiam; queimadas como bruxas, enforcadas como prostitutas, estupradas por serem mulheres. Muito se lutou e se apanhou até que o sufrágio universal, o direito à saúde e à maternidade e a luta por direitos iguais (pelo menos juridicamente falando) fizessem parte do cotidiano.

Dos anos 1980 pra cá, contudo, vi meninas querendo ser paquita da Xuxa, exigindo cachês maiores para posar nua, treinando com devoção aeróbica para ser a nova loira/morena do Tchan, redescobrindo o potencial de sedução que quase foi a ruína das antigas “bruxas”. As novas formadoras de opinião hoje posam em cartazes de cerveja mostrando toda a exuberância de suas formas, almejando apenas aparecer na revista Caras com um corpo esculpido numa sessão de body combat qualquer.

Se essa for apenas uma estratégia de dominação, o foco não é dos mais inteligentes; as mulheres estão sendo tratadas como mercadorias sexies e manipuláveis, cujos únicos atributos são sacudir os glúteos, vender produtos onanistas e afirmar para homens retrógrados que “mulher é tudo vagabunda”, como estou (literalmente) cansado de ouvir.

Naturalmente é rentável, haja vista as vendas dos discos das supra citadas – Mariah Carey saiu do limbo após o fracassado projeto “Glitter” depois de diminuir drasticamente o tamanho da saia em “The Emancipation of Mimi” – mas o preço que se paga por ser mulher continuará alto. A tentativa de evolução de comportamento morreu na boquinha da garrafa.

6.9.06

Uma postagem de agradecimento

Esse blog está sendo mantido de forma peculiar, pelo menos pra mim, que já tive o privilégio de ter um PC em meus áureos tempos como auxiliar de produção de uma multinacional de autopeças (sei...): estou escrevendo em pílulas, entre uma pequena folga e outra e postando quando me sobra uma grana para acessar a net via cybercafés. Tenho um texto já escrito e outro em andamento. Aproveito para pedir desculpas antecipadas se houver demora entre uma postagem e outra. Só que hoje eu tive que postar diretamente no Blogger.

Ontem, dia 5 de stembro, fui limpar minha caixa postal dos spams; achei 2 reais no fundo do bolso de minha bermuda e me dirigi ao cyber perto de casa (embora eu prefira outro, 50 centavos mais caro mas com entrada para disquete (ou, em bom Português, slot) e com fones de ouvido funcionais - afinal, minhas rádios no Pandora são indispensáveis. Entre os comprimidos de Viagra e ofertas imperdíveis - compre uma casa um Long Beach e ganhe um iPod! - vi o aviso de um recado em meu Orkut (em Português, scrap).

Bem... vamos às minhas reações patéticas: meu queixo digitou bn_lkse quando caiu; esfreguei meus olhos com força, imaginando que alguém me deu uma bala de canela com LSD; ao sair, ensaiei uma coreografia à lá Paula Abdul - dois passos pra cada lado, um giro em meu próprio eixo, palmas ritmadas... - e soltei minha expressão chula preferida, o bom e velho "puta que o pariu!".

Não me estenderei mais. Só direi para finalizar:

Muito obrigado, Alexandre Inagaki! Muito obrigado mesmo!

3.9.06

Tá fresquinho, tá bonito, tá gostoso!

Se você quer manter contato com as pessoas, principalmente se você tiver evitado isso durante muto tempo da vida, ande e vá onde elas vão. Como pessoas precisam comer e se higienizar, aglomere-se em supermercados e feiras-livres. Apesar dos supermercados terem a vantagem óbvia da proteção contra as intempéries e o sol, é nas feiras que o burburinho é mais acalorado.

Imagine uma manhã de domingo com céu azul, como essa em que escrevo. Entre quatro e cinco horas da manhã os primeiros feirantes chegam, dispondo suas caixas, engradados, lonas, armações. Nem bem eles têm produtos à mostra os primeiros fregueses, senhores e senhoras com mais de 50 anos carregando sacolas de lona ou carrinhos de metal, já procurando as melhores frutas e os peixes mais frescos.

O sol ameaça aparecer, deixando o horizonte carmim. Os demais fregueses estacionam seus carros, ou saem dos ônibus calmamente ou simplesmente caminham. O burburinho aumenta; os aromas se intensificam. Os pescados ainda estão cheirando bem, uma mistura de escamas e gelo, as frutas invadem o ar e pintam as barracas, dando um tom impressionista à cidade. Há flores sendo vendidas, e como não sei o nome delas (invejo as senhoras que desfilam conhecimento botânico ao ver uma vaso púrpura ou lilás: "olha, que gérberas lindas", ou "será que os crisântemos podem ser transplantados?") apenas admiro e sinto seu cheiro.

Há quem se aproveite das feiras para legalizar a condição de camelô e vender CD's piratas. Desde recentes lançamentos a módicos 5 reais a caça-níqueis do tipo "As melhores canções de...". Dia desses me deram um CD pirata da Madonna, com o título de The Best of Madona (sic), com 2 músicas da... Cyndi Lauper. Bem, mas estou divagando.

Claro que não poderia deixar de falar do supra-sumo dos odores: os das barracas de alimentos para consumo imediato. Que tal uma com produtos deriavdos de milho? Pamonhas apetitosas, curau, suco de milho... ah, para um gordo como eu, é simplesmnete irresistível. Mas o que mata é a bomba calórica dos pastéis. Na feira dominical há quatro. Lembram daqueles desenhos onde o personagem vai até o alimento voando, guiado pela fumacinha exalada por ele? É mais ou menos isso: os banquinhos em volta da barraca nunca ficam livres; pessoas conversam animadamente entre dentadas no pastel, que pode ser os tradicionais (queijo, carne, palmito) ou mesmo invenções - os mal-humorados chamam de invencionices - como o bauru, frango com catupiry...

E sempre entre uma sacola e outra há o papo com um conhecido que não víamos há meses ou anos ou algum desconhecido ávido por cinco minutos de prosa. Já ouvi histórias escabrosas sobre filhos desnaturados, relatos de viagens, receitas de comida e remédios caseiros, conversas de pescador, ou apenas as obviedades sobre o tempo - meteorológico ou pessoal ("no meu tempo... ").

Estou com três sacolas: uma com maçãs, outra com carambolas e mais uma com bananas prata. Ouvi contos sobre um casamento modorrento, uma partida de bilhar perfeita; vi dois candidatos a deputado estadual sorrindo para tudo e todos. Respirei o ar perfumado com peixes, melões, gorduras e violetas. Domingos assim merecem um bordão daqueles insequecíveis.

"Olha o tomate, senhora! Uma bacia, dois real!". "Tá docinho, moço, quer provar? É só um e cinqüenta!". "É pra acabar!"