11.9.11

Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros



O mundo do entretenimento está numa encruzilhada. Já não há mais espaço para arroubos criativos que não possam vir a gerar dividendos, pois não há mais lugar para a inocência e o romantismo, se é que em algum momento da história houve inocência e romantismo. Mesmo os que pregam uma espécie de anarquia criativa querem, em algum momento, ser reconhecidos pelas suas obras. Como a indústria do divertimento audiovisual movimenta quantias de dinheiro nada desprezíveis (basta lembrar os US$ 6 bilhões arrecadados pela indústria dos videogames no primeiro trimestre de 2011 – isso mesmo, TRIMESTRE), não há muito mais espaço na mesa dos executivos de grandes corporações da mídia para meros arroubos criativos.

É sob este prisma que o livro Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros (Abraham Lincoln: Vampire Hunter) deve ser analisado. O autor, Seth Grahame-Smith, não deve ser menosprezado por sua suposta tendência canibalesca, ao prover um cozido ficcional-histórico. O que ele fez, e com muita competência, foi produzir e apresentar um produto para uso futuro no cinema, games e programas de TV. Usar a figura emblemática do 16º. presidente estadunidense e fazer dele um caçador de vampiros sem que sua biografia fosse sequer desconstruída – pelo contrário, graças às óbvias lacunas que todas a figuras históricas deixam graças a informações não comprovadas ou documentos inconclusivos, há espaço de sobra para a nobre arte de criação de teorias da conspiração, arte dominada com mestria pelos estadunidenses – deu margem para que o livro, imprecisões físicas e literárias à parte, cumprisse o papel de apresentar ao público e aos investidores um pré-roteiro elaborado o suficiente para não ofender a inteligência do leitor e para dar um tratamento imagético inicial aos donos dos talões de cheque em Hollywood.

Não podemos esquecer que o próprio Grahame-Smith é um homem de cinema e tevê, pois é coproprietário da Katzsmith Production e cada passo que ele dá é previamente calculado para que possa ser transformado em plots televisivos ou cinematográficos. Mas isso tira os possíveis méritos do livro? Claro que não. O objetivo primordial da obra foi alcançado: é divertimento que faz com que quem conheça a biografia oficial de Lincoln busque as referências nominais usadas nas partes onde os ficcionais vampiros aparecem, além de atiçar a curiosidade de quem não tem muita intimidade com a história tanto de Abe quanto da Guerra da Secessão. Malandramente, aproveita-se do hype vampiresco que ainda inunda o imaginário das pessoas, graças a obras como True Blood, The Vampire Diaries e (tá, tá certo...) a saga Crepúsculo.

Marcelo Hessel, do site Omelete, disse que um dos grandes problemas do livro é a unidimensionalidade de Abe Lincoln, assepsiando sua personalidade e o tornando uma espécie de versão em carne e osso do Capitão América. Nós, brasileiros, não veríamos problema algum em ver um personagem histórico gringo ser desconstruído para fins “artísticos”; o grande problema é a grande idolatria que o nome Abraham Lincoln causa nos EUA. Por mais que Seth Grahame-Smith queira amealhar seus milhões de dólares usando a liberdade criativa (podendo inclusive apelar para a primeira emenda da constituição estadunidense), ele deve ter achado que já foi livre demais ao incluir vampiros na trajetória de vida do presidente. Na versão para o cinema provavelmente o senhor Lincoln será um pouco mais ousado e com nuances mais cinzentas.

Sabia exatamente o que me aguardava quando comprei o livro e ao terminar imaginei o tratamento que o diretor Timur Bekmanbetov dará ao filme. Bem diferente dos meus anos pueris, onde os livros que eu lia formavam-se apenas em minha imaginação. Bem vindos à era nerd do entretenimento mundial. Os super-heróis já não são mais a fronteira final.

Abraham Lincoln: Caçador de Vampiros
Autor : Seth Grahame-Smith
Tradução: Alexandre Barbosa de Souza
Editora Intrínseca
333 páginas
 

Um comentário:

Nando Dibe disse...

Escrevendo deste jeito, é mesmo uma pena você ficar restrito ao blog. Volto a insistir: mande seus textos para a Rolling Stones, Alfa, Caros Amigos... sei lá. Existem várias publicações hoje em dia. Tente. Seu texto tem qualidade e tem estilo. Você é fluído e conhece aquilo sobre o qual escreve. Você passa segurança para quem lê. Está de bobeira aí, porquê?
Adoro você, Sid.